sexta-feira, 24 de junho de 2011

Coisas de Invernos ou Outono



Era um dia de inverno, ou será que era de outono? Não sei, nunca soube.
Lá do outro lado do céu, eu consegui ver, as nuvens não quiseram ficar. Estavam todas acima de mim, e a chuva estava bem pesada – você me entende, não? Alguns ventos passavam bem pertinho de mim, eu os sentia, mas guardei meu corpo escondido por um muro. Eu vi muitos carros passarem pela minha frente e também percebi que muita gente me olhava, ou será que olhava para ele? Com seu casaquinho azul-marinho e vermelho, com seu pequeno corpo não escondido do vento, segurava minha mão com uma das suas pequeninas, enquanto a outra ficava bem perto do queixo, fechada, com aqueles dedinhos brancos, mas não tanto, e de unhas cortadas. Ele olhava para longe, para um lugar que só ele podia ver, e eu ficava observando-o assim, desse jeito tão pensativo, de boquinha fechada, com os belos fios de cabelo claros e bem finos…
Em nenhum momento, quando a chuva bateu em seu braço ou face, ele reclamou ou virou os seus olhos, que pareciam tristes, para os meus, embora eu quisesse encará-lo. Olhando-o, não consegui me conter, e querendo muito, mas sem perceber, peguei sua mão, aquela que ficava próxima ao queixo, e levei-a até meu nariz. Senti o aroma de criança e o contato com sua pele fria e lisa. Depois eu beijei aquela mãozinha, e eu já estava sorrindo – era muito para mim.  Sem parecer se alterar – como se ainda visse algo que apenas ele podia enxergar, embora tivesse noção de que havia se atrapalhado todo após meu roubo de carinho –, finalmente virou os olhos para os meus, que aguardaram esse momento. Aqueles olhos castanhos escuros que ficavam abaixo de uma sobrancelha fininha… Disse-me: “Por que você fez isso?”. Sua voz estava calma, como costumava. Eu achei incrível como aquele humano conseguia ser daquele jeito. Sem pensar muito, respondi rapidamente: “Porque eu te amo. Você não gosta do meu amor?”. Seus olhinhos logo se tornaram cor de amêndoa. Nos cantos de sua boca algo parecia fluir naturalmente. Eu acho que ficou envergonhado. Querendo esconder um forte sorriso – o que ocorreu sem êxito, de modo que sorriu desajeitadamente –, ele deixou-me segurando suas mãos – o que eu realmente gostei, além do fato de vê-lo sorrir por minha causa – e voltou o rosto para o lugar onde deveria estar aquilo que antes olhava, mas tudo havia mudado para melhor, nada seria como antes…


Por: Ítalo Héctor de Medeiros Batista

domingo, 19 de junho de 2011

De volta

Passaram-se muitos tempos e foi em vão pegar no papel para tentar escrever uma linha se quer, era impossível arrancar alguma palavra desse meu interior vazio, mesmo que esta palavra explicitasse alegria ou tristeza. Mas o que importava não eram as produções, não se tinha algo para apontar como causador, não havia fatos, o que era o pior, o único responsável por tudo isso foi o tempo que paralisou a minha produção de escrever.
Não é fácil olhar para si mesmo e sentir que nada o que você pensa ou sente acaba sendo tão provável a ponto de ser passado para o papel. O seu eu – lírico acaba ficando como um balão, um balão cheio de gás, cheio de nada. Fica somente você e o seu reflexo, sem compreensão e aquele “amigo” que lhe acompanhava nos pensamentos e logo após passava a ser escrito no papel, sumia. Não foi diferente comigo, nada respondia aos meus gritos interiores, eram gritos de horror, era como se eu procurasse a minha sombra que nos acompanha em todos os lugares, em todos os tempos cronológicos, mas passou a não mais existir. Some e pronto, sem nenhuma explicação, sem adeus.
Presenciar diversos fatos, escutar tantas palavras, escrever tantas bobagens, apreciar tantas imagens e nenhuma delas me satisfazer. O que eu estava procurando? Será que eu havia me perdido de vez? O que aconteceu comigo? Aonde foram parar minhas palavras? Será que estavam embaixo da minha cama, com medo das minhas reações tão prováveis? Foram milhões de perguntas que ficaram sem respostas, e ficarão, a não ser que alguém, um dia, em algum lugar escute aqueles meus gritos de horror e possa me ajudar a compreender como as coisas mais banais acontecem e por qual explicação elas se esvaem no silêncio do infinito.
Agora não há mais tempo de seca, ficou somente um radicalismo, talvez seja uma mudança para modificar todas as palavras, tirando-as de sintonia, deixando-as desorganizadas sobre o papel, saindo sem freios como um monte de areia que cai sobre uma construção de edifícios. Tudo isso me fez enxergar o mundo sem limites, com calma, mas sem fronteiras. 

terça-feira, 7 de junho de 2011

Descrições de uma madrugada á noroeste.

Sexta-Feira 04/02/2011, às 00:01

Já se passa da meia-noite. Estou na sala, debruçado sobre a mesa e à luz de uma vela – faltou energia em quase todo o país, mas não me pergunte como sei isso, pois então eu teria que escrever muito, muito, e estou cansado.
É tudo tão abafado, silencioso... Mas as folhas de papel e a caneta cortam secamente essa calmaria, reverberando de agonia, gritando em meio ao calmo.
Escuto latidos de cachorros lá longe, mas tudo é escuridão, não posso enxergar muita coisa à minha frente. Da brecha da janela, também escuto um barulho ensurdecedor diante dessa “tranquilidade”, que só é perceptível se o procurarmos. Percebo logo que é um automóvel, e então ainda mais longe surgem mais desses ruídos. Às vezes dá para ver uns pontos de luz lá na estrada, avenida; é um belo espetáculo.
Onde estou, há o som de insetos como grilos e cigarras... Tudo é música de fundo.
Agora a pouco fui ver o céu, as estrelas parecem ter se multiplicado, está tudo bem azul, a não ser pelas nuvens lá no horizonte noroeste, estão todas tão iluminadas que parecem montanhas (uma assumiu forma de baleia), e me pergunto se essa luz vem da lua, que vem do sol, que torna dia o meu horizonte noroeste.
Acabei de queimar um pouco a ponta de meu lápis. Eu gostaria de saber como sairia a escrita, mas a não ser a primeira letra, o resto está normal.
Lufadas tornam-se mais ferozes e barulhentas nesse silêncio. Eu continuo com calor. A luz da vela está bruxuleando, ficando mais baixa, e meu frenesi em escrever torna-se ainda mais barulhento.
Agora são dezoito minutos da manhã, e o céu decidiu guarda-se – nublou! O telefone acabou de tocar, logo fui atender, estou com ele preso ao meu ombro, mas ninguém fala, não há chamada, só um zumbido. Será que a energia voltou?
Acabei de ver na lâmpada do banheiro, ainda não...
Alguns carros projetam luz na minha janela de vidro, e de repente sombra de galhos de árvores surgem. O filho deficiente mental do meu vizinho faz barulho, grita, chora ou tenta se expressar de alguma outra forma barulhenta, já que não sabe falar. Às vezes ele se cala, mas eu sei que continua lá, com medo.
Agora a pouco fui ao nosso pequeno terraço fechado. Eu quis ver o céu novamente... Tudo parece tão mais escuro. O vento balança as árvores que ficam uma em frente da minha casa e a outra do lado, e eu vejo os galhos se mexerem... Adoraria estar com uma vela escrevendo no frio lá de fora.
As nuvens do horizonte noroeste estão se espalhando, o céu está ficando mais iluminado e fechado. Na abertura entre as nuvens há muitas estrelas, mas tudo ficou mais escuro e quieto.
Não estou com sono, mas acho que se eu não for me deitar meu pai reclamará. Agora darei mais uma olhada no céu que não vou poder descrever aqui. Boa noite.
P.S: No horizonte noroeste é como se o dia estivesse amanhecendo. Engraçado, não é? Noroeste! E a copa das árvores balança, eu as vi e vejo a tudo...
(alguma hora depois)
Não fui me deitar. Sentei no pequeno terraço e fiquei escutando os sons, vendo o que eu podia. Percebendo a negritude do meu olhar, do ar que deveria não ser visto, mas eu consigo. Só depois me deitei, mas a muito caro.

Por: Ítalo Héctor de Medeiros Batista