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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Tristes velhos fatos

Quem você abraçaria?
Quem você amaria?
A quem você voltaria
quando a noite chegasse e, sozinha embaixo dos cobertores,
todo o seu corpo buscasse um sentido qualquer que seja
que explicasse sua dor?

A quem você responderia?
Para quem você ligaria?
E quem você escolheria
quando acima da sua janela, em um céu de estrelas,
nem uma ao menos você consegue enxergar?

E me diga agora,
qual você escolheria para ser sua?

Para quem você dançaria?
Quem faz você brilhar?
E quem poderia
te por no colo, enxugar suas lágrimas
e entender que você só queria chorar?

Por quem você esperaria
Quem poderia ser?
Quem você escolherá agora,
se não me escolher?

E me diga agora,
a quem você amaria mais?

sábado, 23 de julho de 2011

Garçom

           - Alguma vez você já sentiu o blues correndo em suas veias, corroendo tudo e deixando apenas a efemeridade de um vazio impreenchível numa daquelas noites em que você percebe que não é nada? Ah sim, você sabe do que eu estou falando!
            Mentiras são verdades contadas baseadas naquilo que queremos acreditar. Conte-a uma vez e você estará mentindo. Conte-a outra vez e ainda assim, será uma mentira. Conte-a centenas de vezes e terá uma verdade.
            Nós? Nós somos feitos de mentiras, somos construídos e baseados nelas. Todos os dias abrimos a janela do nosso ego para o jardim de nossa subjetividade e lá está, tudo no exato local em que deixamos quando as luzes se apagaram e fomos dormir.
            E é assim que, ao menor indício de uma contrariedade naquilo que construímos e acreditamos ser perfeito, nos desestabilizamos de nossos propósitos. Colocamos nossas bases em fatores externos, totalmente alheios à nossa sensação de controle, seja um relacionamento, uma conquista, uma estabilidade, um estado de espírito. E, de repente acordamos de manhã, olhamos rapidamente e notamos que alguém veio, pisou em nossa grama, esmagou nossas flores e destruiu nosso sonho.
            Perdemos o rumo por medo, medo de perdermos aquilo que alcançamos. E então paralisamos. O medo se torna o caminho para o lado negro. Para o caos. Mas e se o aqui, o agora, já não é o caos? E se o caos esteve presente o tempo todo e nós que construímos barreiras, ficamos cegos, baseados no que vemos e não no que sentimos? Quem é capaz de ter certeza absoluta quando a verdade e a mentira tem o mesmo significado? Ou mesmo, quando não existe verdade absoluta e as mentiras são verdades questionáveis?
            - Não faço idéia meu senhor, sou só um garçom. Mas acho que o senhor deveria parar por hoje.
            - Sou filho do ceticismo e amante do caos que é viver meu caro! Portanto pare de mazelas e encha logo este copo com mais uma dose. Preciso matar algumas verdades!

sexta-feira, 25 de março de 2011

A Catarse

      Primeiro, ele expulsa todos os seus sentimentos até que reste apenas um, o desejo. E este, por sua vez, é tão forte que domina todo o seu corpo até que você esteja totalmente entregue e completamente vulnerável. Seu corpo dirigi-se a ele como se o pertencesse e os instantes seguintes não serão mais raciocinados, apenas sentidos. Você caminha procurando o lugar mais escuro possível onde apenas você, a escuridão e o silêncio se transformarão em um só.

         É chegada a hora e então você toma o primeiro passo. Descrever este ato é como olhar para uma obra prima e entender cada magnífico significado ali empregado. Antes mesmo de levá-lo a boca, um calafrio anuncia o prefácio daquele momento adiado com o seu esforço inválido. Não importa, você tem que fazer isso, você precisa dele agora.

          E então, seus lábios o beijam e logo o fogo gerado pela combustão do fósforo também o beija. Seus olhos se fecham, sua cabeça inclina-se involuntariamente e a fumaça desce traquéia abaixo até chegar aos pulmões e, em milésimos, invade sua corrente sanguínea, distribuindo uma catarse que se estende a cada centímetro cúbico de sangue que corre em suas veias, carregando hemácias preenchidas de uma sensação impossível de ser entendida, apenas interpretada pelas sinapses. A Terra para seu movimento por alguns segundos, suas pupilas dilatam e enquanto lentamente você abre os olhos, enxergando apenas o escuro do céu à noite, com suas estrelas nele mergulhado, a fumaça faz todo o cruel caminho de volta deixando apenas uma dor expressa por um sorriso malhado pela necessidade de mais um trago.

      A vida não passa de uma sucessão de tragédias e melodramas vividos por mundos ideológicos comandados por super-egos, o ser humano.  Contudo, a catarse sentida naquele momento por uma pessoa que parece sentir toda a dor do mundo num só instante parece incompreensível pra muitos, mas é sadicamente aceita por quem a sente. Para esses poucos seres, é sentir-se vivo. Para essas pessoas de dores incompreendidas. É amar.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Cantiga de Ninar

Mastigo, engulo e digiro
Dia após dia a vontade de te matar

Engano, minto, deixo pra lá
Os devaneios puros de um dia me tirar
Verde no teu peito que não posso te amar

E aémero, negro tua tristeza
Brando o caminho sem recordar
Como era a voz que ainda cedo deixava
Um silêncio de martírio como cantiga de ninar.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O gosto do amor

O gosto do amor na verdade é o último sentido que se é roubado por ele e o meu primeiro foi o da visão. Aconteceu em Roma a 4 anos atrás, no hotel The Westin Excelsior Rome em uma das minhas visitas ao consulado italiano. De início, não soube que ela era quem me roubaria o sentido, mulheres não passavam de um hobby e homens de estirpe precisam mantê-los, mas bastaram algumas horas de conversas para que eu me desse conta de que estava diante da mulher perfeita e apenas uma noite em sua cama para que percebesse que estava apaixonado, dali em diante meus olhos a pertenciam. Pela manhã, o lençol engelhado e o travesseiro encharcado com seu cheiro evidenciavam a desarmonia dos fatos e os focos de luz sépia, criados pelos raios que passavam pela cortina caqui, atingiam meu rosto revelando uma antítese de expressões faciais adversas ao que meus olhos mostravam. Foi então a primeira vez que ela partiu e que levou consigo meus sentidos da visão e olfato.
O dano era irreparável, meus olhos preencheram-se com um olhar vazio, distante, errado e facilmente identificado pelas minhas pupilas esverdeadas nas órbitas e perdidas na extensão das linhas inquietas do whisky que incorporava o copo. Naquela noite, sozinho em um pub em Londres, eu encarava o copo tentando imaginar se era capaz de me levantar se tomasse mais uma dose enquanto seu cheiro invadia o pub como uma tempestade que chega sem avisar, começando com o tom de canela doce e levemente compenetrado e por fim, devidamente apimentado graças à nota de pimenta somente identificada pela presença do toque de sua mão sobre meu ombro. Era ela! Meus olhos logo a alcançaram e num sentido convexo em direção ao seu rosto em que se formava uma penumbra graças às pobres luzes do pub, ela me roubaria mais dois sentidos.

                - Posso me sentar? – Falou.
                - É claro! – E logo, a audição a pertencia.


Deu-me uma desculpa qualquer a respeito de como me encontrara, me enalteceu com alguns elogios e disse que me devia uma explicação sobre o que tinha acontecido em Roma. O fato era que estava com medo, medo, pois compartilhava do mesmo sentimento que eu e recordava-se saudosista daquela noite que fugiu apenas por não se conformar com a situação em que se via menor frente a outro ser por causa de um sentimento mais forte e inexplicável que acreditava não existir e logo foi interrompida com meu beijo, que distraído não percebia que naquela hora acabara de entregar mais um sentido, o tato.
Dois anos e 5 meses após recusarmos os próprios medos, entramos num mundo ao qual não nos atrevíamos e que condicionados aos nossos corpos, mais pertencentes a mesma alma, vivíamos um para o outro. Mais cedo naquele dia, tinha me dito pra que não me atrasasse, pois às 21:00 me faria uma surpresa. Deixei o escritório as 20:27, parei em uma taberna as 20:40 e pedi uma garrafa do melhor chardonnay, pra comemorar com ela o dia em que nos conhecemos. Fiquei preso em um engarrafamento as 20:49 e cheguei em casa as 21:17. Entrei, pé direito primeiro o esquerdo em seguida. Senti o cheiro de salmão, sorri, e logo o identifiquei na mesa, perfeitamente preparada para a ocasião.

             - Amor? Comprei aquele chardonnay chileno que você adora. – Sem resposta. Sigo para o quarto.
              - Desculpa, eu falei que não me atrasaria, mais eu peguei engarra...

A garrafa vai ao chão. O grito forte e rasgado ecoa por toda a casa. A faca ainda cravada em seu seio indicava o último dos golpes apressados desferidos contra seu corpo pelo ladrão. O sangue encharcava a cerâmica e aos poucos ia tocando meu corpo. De joelhos, com ela em meus braços, beijo seu rosto maquiado com seu próprio sangue ao tempo que sinto o gosto de metal do mesmo misturado ao sódio de minhas lagrimas à medida que vejo ali, minha vida tomar forma de gelo. Aquele era o gosto do amor, aquele era meu último sentido.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Crônica de um morto vivo.

Alta madrugada. Eis a cinza do cigarro representando a sua desgraça que mesmo apagada tem a necessidade de gerar um incêndio relembrando e amaldiçoando tudo aquilo que tentou construir. Como uma praga, uma sujeira, uma mancha que não pode ser limpa. Uma mancha que está cravada para sempre em rosto deformado e desfigurado por uma traição que assim como a sua beleza, levou o único ser que já foi capaz de amar.
Havia então a ânsia de gritar, de absorver a alma de prostitutas quaisquer, na sede do tejo de suas pernas encravadas, no ímpeto ilusório da afirmação de ser homem e ter que cumprir tal papel.
Ela. Cuja memória se esvai na voz de prazer de vários homens, dança num quarto onde uma parede composta de um espelho cego a separa dos desejos insatisfeitos de ver e não poder tocar de um macho qualquer. Justo em contra posição a sua cegueira de faces, ainda consegue ouvir a voz rouca e rasgante de seu conjugue gritar no trailer que pôs em chamas. O mesmo aonde foi amarrada, lhe foi arrancada pele, carne, sangue e dignidade pelo ciúme do desgraçado que por razões que não entende, não consegue esquecer.
Hoje, a distância dele e do filho, cola seu corpo no lar cujo metal se desfez. A voz do esposo agora se faz em gritos e é sussurro de gemidos de homens que agora a pagam. Pagam por satisfazer desejos acalados, silenciados e alimentados daqueles homens demasiadamente humanos. E os faz, não por não ter escolha. Os faz, por satisfazer também seus desejos sujos e indignos (indignos apenas para os/as hipócritas). Os faz, porque no metal da pele daqueles homens sente seu corpo arder, suar, queimar em arrependimento na dança dos corpos. Os faz, porque sente estar deitando com o homem que amou e que hoje se faz pó. Assim como o que restou dela.
Ele. Na ponta dos cabelos dela, morenos antes. Respira a liberdade enroscado em um sentimento falso, mentiroso, capaz de destruí-la com apenas uma frase. Uma verdade que é incapaz de contá-la, permanecendo às escuras, destruindo e criando um homem que só existe na presença dela. Carne sedentária, íngreme e impetuosa abrange em pele, veias e sangue sua vontade incontrolável de consumir como um parasita todo o êxtase impregnado como cheiro de cigarro na voz dela ao ouvir que o ama. Mesmo que se contenha em penumbras de oscilação de desejos luxuriosos. Mesmo que se contenha em contar que ali se faz presente seu homem, ou parte desfigurada do que restou dele.